Cuidar de alguém é um ato de dedicação, mas também pode ser um desafio enorme, tanto no aspecto físico quanto emocional. Em muitos lares brasileiros, filhos, cônjuges e parentes assumem a responsabilidade de cuidar de familiares idosos, doentes ou com limitações. Trata-se de uma rotina exaustiva que, muitas vezes, coloca em xeque a própria saúde dos cuidadores.
Com o envelhecimento da população, essa realidade só tende a crescer. De acordo com o IBGE, de 2000 a 2023, a proporção de idosos (60 anos ou mais) na população brasileira quase duplicou, subindo de 8,7% para 15,6%. Em 2070, cerca de 37,8% dos habitantes do país serão idosos.
Diante disso, é urgente falar sobre quem está por trás do cuidado: o cuidador, essa figura essencial, mas frequentemente esquecida.
Dessa forma, vamos falar nesse conteúdo sobre o impacto da rotina de cuidados, o que é o estresse do cuidador, os riscos do isolamento, e também como é possível preservar a saúde física e mental mesmo diante de tantas responsabilidades.
A rotina muitas vezes invisível do cuidador
Dar banho, trocar fralda, acompanhar em consultas, administrar medicamentos, preparar comida, levantar durante a madrugada. Essas são apenas algumas das tarefas enfrentadas por quem cuida de um familiar doente ou idoso.
Embora esse tipo de cuidado possa parecer natural, ele exige energia, paciência e tempo. E, muitas vezes, essa rotina não dá espaço para o autocuidado.
No Brasil, existem basicamente três tipos de cuidadores: os familiares, que assumem a responsabilidade por amor ou necessidade; os trabalhadores que encontram na função uma alternativa para o desemprego; e os cuidadores profissionais, que têm formação específica para exercer a função. Em todos os casos, a sobrecarga é um denominador comum.
Durante a pandemia, esse cenário ficou ainda mais pesado. Segundo uma pesquisa da Embracing Carers, cuidadores brasileiros não remunerados passaram, em média, 25,1 horas por semana nessa função, quase duas horas a mais que a média global.
Além das tarefas práticas, muitos também precisam oferecer apoio emocional, o que aumenta ainda mais o desgaste.
Os efeitos do cuidado contínuo na saúde dos cuidadores: quando o corpo e a mente pedem socorro
O estresse do cuidador, também conhecido como síndrome de burnout, é um estado de exaustão física e mental provocado pelo cuidado contínuo com outra pessoa. Os sintomas incluem tristeza, irritabilidade, ansiedade, insônia, alteração no apetite, apatia e até pensamentos suicidas.
A psicóloga e gerontóloga Gleice Vellozo explica, em entrevista ao portal Drauzio Varella, que o cuidado vai muito além das tarefas diárias. Ele envolve também aspectos emocionais, sociais, familiares e espirituais. Além disso, a combinação de tarefas constantes, responsabilidades emocionais e falta de apoio pode levar a um quadro grave de esgotamento.
Já a jornalista e médica Maureen Feldman, em palestra acompanhada pelo G1, destacou que o isolamento é outro fator de risco. O número de horas que passamos sozinhos aumentou nas últimas décadas, ou seja, reduzimos o convívio com amigos e familiares.
Essa solidão afeta diretamente os cuidadores, que muitas vezes deixam de lado sua vida pessoal para se dedicar integralmente ao outro.
Os riscos da fadiga por compaixão na saúde dos cuidadores
Outro fenômeno cada vez mais comum entre cuidadores é a chamada fadiga por compaixão: uma exaustão emocional causada pela exposição prolongada ao sofrimento alheio.
Essa condição é considerada um trauma secundário e se manifesta por sintomas como raiva, tristeza, cansaço extremo e falta de motivação, bem como dificuldade de concentração.
Segundo dados apresentados por Feldman, dois terços dos cuidadores americanos relatam sentimentos de solidão e 18% afirmam que ela é severa. Sem falar que muitos estão na faixa dos 50 anos ou mais e já lidam com doenças crônicas próprias.
Em alguns casos, cuidadores idosos, como cônjuges, enfrentam a dupla jornada de cuidar enquanto também precisam de cuidados.
Como o cuidador pode cuidar de si mesmo?
Diante de tantos desafios, é fundamental que o cuidador procure cuidar também de si. Mesmo em meio a uma rotina apertada, é possível fazer pequenas mudanças que ajudam a preservar a saúde física e emocional.
1) Busque informação
A primeira etapa é entender a condição da pessoa que será cuidada. Conversar com médicos, fazer cursos de capacitação e buscar orientações específicas ajudam a reduzir a insegurança e a ansiedade. Diversos cursos gratuitos ou acessíveis estão disponíveis em instituições e plataformas online, e podem fazer toda a diferença.
2) Participe de grupos de apoio
Grupos de apoio oferecem troca de experiências, acolhimento emocional e até informações práticas. Eles podem ser presenciais ou virtuais, e geralmente são organizados por ONGs ou por associações voltadas a doenças específicas.
3) Divida responsabilidades
Muitas vezes, o peso recai sobre uma única pessoa, o que aumenta o risco de esgotamento. É importante conversar com a família, distribuir tarefas e, se possível, contar com uma rede de apoio.
Em casos de dificuldade financeira, é possível acionar a Promotoria do Idoso para intermediar o apoio de outros membros da família.
4) Conheça seus direitos
Cuidadores podem ter acesso a benefícios sociais pouco divulgados. O Estatuto do Idoso determina que os filhos devem prover a subsistência dos pais quando necessário. Caso isso não seja possível, o poder público deve garantir um salário mínimo de benefício mensal.
Medicamentos, fraldas e equipamentos também podem ser requisitados por meio de processos administrativos. Informe-se junto ao Ministério Público ou à Defensoria Pública da sua região.
5) Separe tempo para você
Ter um tempo para si mesmo não é egoísmo, é necessidade. Ou seja, reservar momentos para descansar, sair com amigos, assistir a um filme ou apenas ficar em silêncio é essencial para manter o equilíbrio emocional.
Atividades como exercícios físicos, boa alimentação, momentos de espiritualidade e lazer ajudam a recarregar as energias.
Esteja atento aos sinais de alerta
Saber identificar os sintomas de esgotamento da saúde dos cuidadores é importante para evitar quadros mais graves. Alguns sinais de que é hora de pedir ajuda incluem:
- Vontade constante de chorar;
- Apatia;
- Insônia;
- Dificuldade de concentração;
- Irritabilidade e agressividade;
- Consumo excessivo de álcool ou medicamentos;
- Sensação de impotência ou desesperança;
- Isolamento social;
- Pensamentos negativos recorrentes.
Caso esses sintomas se prolonguem ou piorem, buscar ajuda psicológica é essencial. Portanto, lembre-se: não é possível oferecer o melhor cuidado ao outro sem cuidar de si primeiro.
A necessidade do cuidado compartilhado
A pergunta “quem cuida de quem cuida?” precisa estar cada vez mais presente em nossa sociedade. Cuidadores são a base do bem-estar de milhares de pessoas em situação de fragilidade. No entanto, sem suporte, podem adoecer física e emocionalmente.
Reconhecer a importância dessa função, promover políticas públicas, criar redes de apoio e cultivar uma cultura de empatia são passos fundamentais. Afinal, o cuidado precisa ser mais humano, mais coletivo e menos solitário.
Você já passou ou está passando por essa experiência de cuidar de alguém? Compartilhe nos comentários como tem sido sua jornada: sua história pode ajudar outras pessoas que estão vivendo o mesmo desafio.
* Confira também aqui no blog o post Como está a sua saúde mental? Veja 7 cuidados simples para manter-se em equilíbrio.
** Com informações do portal Drauzio Varella e G1.